Cesárea com assistência humanizada!

Cesárea com assistência humanizada!

Olá queridos! Estou afastada desde quarta quando entrei em trabalho de parto, mas tenho recebido o carinho de todos através de suas manifestações aqui e pelo Whatsapp. Muito obrigada pelo carinho e pela compreensão.
Bem, meu afastamento não se deu apenas pelo nascimento do Vitor (o que por si só já justificaria), mas também por estar de luto. Sim, o luto do não-parto e hoje decidi falar a respeito. Muitas mulheres passam, não sou a única, mas é algo de que pouco se fala. Então, senta que lá vem textão…

Não é a primeira vez que passo por isso e na primeira foi muito pior. Quando estava grávida do Gui tinha certeza que ele viria ao mundo por parto normal. Tentei me preparar ao máximo para isso, mas confesso que não busquei as informações corretas ou as pessoas certas para dá-las. O resultado foi uma sucessão de erros que se tornaram uma sucessão de “ses”. E se eu tivesse esperado mais um pouco para sair de casa? E se eu não tivesse sido internada tão cedo? E se eu tivesse um plano de parto? E se e se e se e se… Sofri por um ano com tudo isso. Sim, eu e o Gui estávamos bem, mas aquela cesárea deixou uma cicatriz muito profunda, para além da pele, na alma. Uma cicatriz que para mim era um carimbo de incompetência.

Então veio uma nova gestação e com ela uma nova chance. Uma chance de eliminar os “ses” e de corrigir os erros. Me preparei de verdade, li tudo o que havia a respeito, busquei um médico que me apoiasse, uma doula que me provesse das informações certas e escolhi o local onde me sentia mais segura. Montei uma pequena equipe em quem podia de fato confiar e não me decepcionei! Foram todos fantásticos desde o início!

Na quarta, dia 16/03, quando fui buscar o Gui no colégio às 12h em ponto, ao sair do táxi a bolsa rompeu, ao contrário do que podíamos prever na consulta do dia anterior! Veio então uma mistura de entusiasmo, medo, susto e alegria que não dá para descrever! Era o meu corpo me mostrando que ele reconhecia toda a minha ancestralidade e isso já me bastava!

Às 13:50h fui no consultório para o Fernando avaliar. Bem, a bolsa tinha rompido, mas o trabalho de parto ainda não havia iniciado e se não iniciasse em 24h teríamos que induzir. Mas o meu corpo sabia o que tinha que fazer e por volta das 17h entrei na fase latente do trabalho de parto! Me mantive ativa, fazendo exercícios na bola, não dava para sair pra caminhar porque estava “vazando”, mas o aumento da intensidade das dores mostrava que só a bola e andar pela casa já eram suficientes.

Enquanto isso ouvia Caetano com fones de ouvido cantando Tigresa, Odara, Rapte-me Camaleoa, Vaca Profana… E isso tudo foi fazendo surgir em mim um força dotada de um instinto verdadeiramente animal, sim eu estava ali como um bicho preparado para parir a cria! Preparado para aquele ato de amor do qual dias antes eu havia falado. Estava ali movida pelo amor! O amor àquele ser que em breve sairia do meu ventre… E os versos de um soneto do Poetinha gritando tudo isso na minha mente:

“Amo-te como um bicho, simplesmente,
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.
E de te amar assim muito e amiúde,
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.”

Às 22h, conforme orientação do meu médico, fui fazer uma avaliação com a plantonista. Tudo ok com o Vitor e comigo. Apenas 3cm de dilatação, mas eu estava bem. Voltei pra casa e continuei a me concentrar, a me conectar… As dores cada vez mais fortes, a bola já não parecia aliviar, então era hora das longas chuveiradas. Em uma dessas, depois de uma sessão de vômitos, decidi ligar pra Cris, minha doula. E eu estava certa! Era a hora de ir para a maternidade! Não estava ritimado, alternava entre uma contração longa, uma média e uma fraca. As longas eram de chorar! As médias me empoderavam e as fracas me lembravam que ainda tinha muito chão pela frente. A plantonista me avaliou e novamente tudo bem comigo e com o bebê, mas, embora estivesse com contrações ativas, o trabalho de parto não havia evoluído tanto: 4 para 5 cm. Isso já era quase 01h da madrugada do dia 17/03.

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A Cris e o Fernando insistiram para eu esperar a banheira desocupar, para usá-la antes de partir para a analgesia, mas eu sentia o meu limite cada vez mais perto. Entramos com a analgesia às 02h. Com o corpo dormente adormeci por 3h. Acordei com as dores voltando e na esperança do meu corpo ter trabalhado durante aquelas horas de descanso e relaxamento. Às 6h as dores já estavam novamente muito próximas do meu limite, não podia ir para o chuveiro nem para a banheira porque estava com catéter da analgesia, minha esperança era na avaliação.

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E foi então que veio o golpe no estômago: os mesmos 4 para 5cm. Àquela altura já deveria estar com pelo menos 8cm. E um filme começou a passar novamente na minha mente… Podíamos esperar? Sim, os batimentos cardíacos do Vitor estavam ok, assim como os meus, a minha pressão… Uma hora o colo iria dilatar e disso nós sabíamos, mas a que custo? Estava claro que o trabalho de parto apenas se arrastava e não progredia como o esperado e o partograma era a prova irrefutável disso. Era hora de decidir.

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Decidi não reviver as angústias de 4 anos atrás, decidi aceitar a dor da cesárea, decidi aceitar novamente o luto do não-parto, decidi aceitar que algumas coisas acontecem simplesmente porque têm que acontecer. E estas fotos aqui foram exatamente do momento em que aceitei tudo isso.

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Tia Cris vestindo Vitor!

Tia Cris vestindo Vitor!

Doeu. Doeu muito! Mas passou! As lágrimas que correm enquanto escrevo tudo isso são muito mais frutos do puerpério que do luto. Posso dizer que meu corpo me libertou. Não existe “e se?”! Sei que tudo que pode ser feito foi feito. Meu corpo também trabalhou para isso e me fez novamente experimentar as dores do parto e como isso é gratificante! Uma dor que vem do amor e, como tal, é libertadora!

Marina De Abreu Ampessam