Na semana passada uma enfermeira obstetra que admiro muito, postou em sua página sobre um curso de formação de doulas na sua cidade que a chocou. Uma das interessadas disse estar fazendo o curso pois estava aposentada e queria uma renda extra, uma renda “fácil” que não demandasse esforço físico. Infelizmente com a popularidade das doulas surgem mensalmente cursos como esse em diversas cidades. Para se ”tornar” doula basta um curso qualquer e um certificado será entregue.
As pessoas assistem vídeos de partos editados, olham as fotos lindas com filtro e entendem que ser doula é apenas segurar a mão da gestante. Ser doula envolve MUITO esforço físico (experimente usar o rebozzo) e mental, especialmente quando as coisas saem do normal.
As pessoas assistem vídeos de partos editados, olham as fotos lindas com filtro e entendem que ser doula é apenas segurar a mão da gestante. Ser doula envolve MUITO esforço físico (experimente usar o rebozzo) e mental, especialmente quando as coisas saem do normal.
Esse post não é para dizer a você que deseja se tornar doula precisa ter empatia, compaixão, ser paciente e amar cuidar dos outros pois isso você já deve saber e é a base da doula! Esse post é para quem pretende, entender que a sua função vai muito além de segurar a mão da parturiente, e que nem sempre os partos serão fáceis e rápidos.
Antes de ser doula eu já era mãe e tinha experiência profissional como técnica em enfermagem.
No meu estágio a obstetrícia era a ÙNICA área onde eu me via trabalhando. Mas veja bem, me formei como TÉCNICA e descobri que eu não queria fazer nada daquilo que aprendi. Ainda no estágio percebi o quanto as mulheres precisavam de APOIO, tanto antes do parto, quanto durante e depois, e era isso que eu gostava de fazer.
Eu fazia questão de passar em cada leito e parar alguns minutos para conversar com as mães e ver se eu podia ajudar de alguma forma. E ajudei! Foi gratificante conseguir ajudar uma mulher com mamilos invertidos a amamentar, quando ela não acreditava ser possível. Foi gratificante poder ser apenas ouvinte daquela jovem mãe que havia parido o terceiro filho com o marido estando preso.
Quando comecei a doular eu tinha toda a técnica mas eu sabia que o mais importante era ter paciência, empatia e tranquilidade. Com o passar dos partos comecei a perceber que isso não bastava pra mim. Não porque era minha obrigação entender de obstetrícia, ou porque eu devia ajudar a equipe médica, mas porque eu queria poder APOIAR os casais em qualquer situação. Se eu entendo o que está acontecendo, se eu sei como será resolvido, eu consigo explicar para eles e passar segurança.
Comecei a estudar sobre distócia de ombros e percebi que a doula pode ajudar quando ocorre. Enquanto o obstetra resolve tecnicamente, sou eu quem a mulher vai procurar com seus olhos desesperados, quem ela mais vai confiar, principalmente se estiver parindo com um médico plantonista que ela nunca viu. Então eu vou explicar o que está acontecendo, que ela precisa mudar de posição e porque vou pressionar o osso púbico dela. Com muita calma e tranquilidade eu faço com que ela fique tranquila e confie na sua equipe. Já acompanhei alguns partos onde isso aconteceu e todos os desfechos foram positivos.
Quando um bebê nasce sem conseguir respirar, enquanto o pediatra está concentrando fazendo os procedimentos, sou eu quem vai explicar para o casal o que está acontecendo, porque novamente é na doula que eles mais confiam. Assim passo novamente calma e tranquilidade. Mesmo que por dentro eu não esteja tranquila, por fora preciso parecer que estou.
Quando uma mulher tem hemorragia, enquanto a equipe médica resolve e a enfermagem faz as medicações, sou eu quem deita a cabeceira da cama, conversa com a puérpera e explica ao casal tudo que será feito. Nessa hora geralmente os maridos saem da sala porque é demais para eles e a doula os deixa seguros para que eles possam respirar.
Então para ser doula você não precisa ter formação na área da saúde, porque você não estará fazendo procedimentos, mas você precisa ter sim conhecimento básico e ”estômago” para mesmo em situações de emergência (que acontecem tanto em partos hospitalares quanto domiciliares), poder dar apoio, segurança e tranquilidade ao casal. Em 480 partos já perdi as contas de quantas vezes precisei segurar o choro, respirar fundo e ajudar.
Não seja doula por dinheiro, por ”fama” ou por hobby!
Seja doula para fazer a diferença e dar apoio SEMPRE, nos partos tranquilos, nos partos difíceis ou com complicações porque eles vão surgir quando você menos esperar.
Cristina Melo
Doula