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Bia Fotografia – Beatriz Takata

Apesar da mídia ter, nos últimos tempos, aumentado a visibilidade sobre o tema do parto domiciliar, cada vez que eu participo de uma conversa sobre o tema, eu percebo que a maioria das pessoas não faz a menor idéia de como ele acontece na vida real. No terreno da fantasia a mulher sente dores, seu marido chama a parteira. Ela chega com uma sacolinha com alguns panos brancos e uma tesoura.

Ela faz o parto, de certa forma faz o menino nascer, dá um tapa no bumbum, limpa tudo, faz uma sopa, tira o avental sujo e vai embora para casa.

Vou então contar como que acontece, tipicamente, o atendimento de um parto em casa no ambiente urbano, por parteiras profissionais.

Embora existam outros modelos, esse é o que eu e outras obstetrizes e enfermeiras obstetras conhecidas praticamos nos grandes centros.

1) Pré natal: durante a gravidez a parteira vai verificar os exames pedidos pelo médico, vai conversar muito sobre todas as questões de saúde, sociais, emocionais, alimentação, atividade física, trabalho, vai estabelecer um vínculo e uma relação de confiança com a gestante. A cada encontro são verificados todos os sinais vitais e a evolução da gestação, garantindo que apenas as gestantes de baixo risco continuem com o projeto do parto domiciliar. Aquelas que desenvolvem algum tipo de complicação, terão seus filhos em hospital, com a presença da parteira, se ela desejar.

2) Plano de parto: ainda durante a gestação, parteira e casal vão conversar sobre a equipe de atendimento, os riscos possíveisw, as situações especiais que podem surgir, plano B (para onde e com quem ir em caso de transferência). Assim, caso seja necessário usar um hospital, a gestante já sabe para onde vai e quem será o médico que a receberá.

3) Preparação da casa: a parteira entrega ao casal uma lista de sugestões de como se organizar para o parto, os materiais necessários, alimentos e conforto para eles e a equipe. Juntos eles vão pensar onde armar uma banheira inflável, como levar água quente, como manter o ambiente aquecido, enfim, toda a parte da infra-estrutura.

4) Preparação para o parto: o casal receberá indicação de livros, páginas de internet, grupos de discussão virtual, vídeos, cursos e palestras que possam ajudá-lo a se preparar para o evento. O parto se constroi aos poucos, não só através do pré natal, mas também com a relação do casal com outros que estão vivendo essa mesma aventura. Conhecer outras histórias faz aumentar o repertório e a confiança no processo.

5) Quando o parto começa, em algum momento, pela descrição dos sintomas, das contrações e dos intervalos, a parteira vai ao domicílio da gestante verificar o andamento do processo. Nesse momento ela leva as malas com o material de atendimento que cabe a ela: descartáveis, drogas para hemorragia, material de sutura, material de emergência para o bebê, incluindo máscara de ventilação e em geral oxigênio. Mais ou menos que há numa sala de parto hospitalar, é colocado num parto em casa, porém de forma discreta e compacta. Banheira inflável, banqueta de parto e bola fazem parte do material de várias parteiras.

6) Após descarregar o material, a parteira vai fazer a verificação dos batimentos cardíacos do bebê e a dilatação (quando for necessário). Os batimetnos cardíacos serão reavaliados a cada 30 a 60 minutos aproximadamente. É por esses valores que se verifica a vitalidade do bebê. Tudo é anotado num prontuário que ficará arquivado com a parteira. Caso a gestante esteja na fase ativa do parto, a equipe permanecerá até o fim. Caso ainda seja fase inicial, ficará a doula (quando for o caso) e a parteira cuidará de outros afazeres, até a fase ativa de fato começar.

7) Ao longo do processo a parteira estará junto, ajudando, avaliando e anotando. Quando o parto vai chegando ao fim, e começa a vontade de fazer força, a equipe vai preparar um canto para recepção ao recém nascido com material completo, caso seja necessário algum procedimento de reanimação neonatal. Começa uma certa movimentação, porque o bebê está prestes a nascer.
O parto vai acontecer na banheira, ou na banqueta, na cama, onde a mulher preferir. Por baixo, para receber o bebê, vai um lençol descartável. O bebê vai nascer e vai direto para o colo da mãe. Será enxugado e avaliado pela parteira e/ou pediatra (quando houver). Bebê que nasce completamente bem (99%), continua no colo da mãe, ligado ao cordão. Se precisar de estimulação, ou algum procedimento (1%), vai para a mesa de recepção que foi montada. Resolvido, volta para o colo da mãe.

9) Mâe e bebê juntos vão para a cama. A amamentação vai se iniciar. A placenta vai sair. A parteira vai avaliar a integridade da peça, vai verificar sangramento e se há necessidade de dar algum ponto no períneo. Fará os pontos, se necessários, com material estéril. O cordão será cortado em algum momento após parar de pulsar. Possivelmente após a saída da placenta. O bebê será examinado, pesado, vestido e entregue à mãe.

10) A mãe vai comer alguma coisa, vai se ajeitar na cama e permanecerá lá com o bebê e o restante da família. As parteiras vão organizar a casa, fazer a limpeza geral e deixar tudo pronto antes de partirem, cerca de 2 a 3 horas após o parto, levando o material e deixando a casa como era antes do parto. Ao longo dos próximos dias, mãe e bebê receberão as visitas pós parto da equipe, com avaliação e ajuda na solução dos problemas de amamentação.

E a vida continua!

Não parece simples?

Fonte: http://vilamamifera.com/parteriaurbana/parto-em-casa-passo-a-passo/