A minha história com Luana ( mãe da Julia) é antiga, nós estudamos juntas no ensino médio. No final do ano passado, uma amiga em comum Jéssica, nos apresentou e falou sobre o meu trabalho. Luana amou e virou minha doulanda. Nos encontramos mais perto da data provável, ela  participou da minha palestra na loja ECO, e curtimos o carnaval  juntas,  já com 38 semanas.

Nos falávamos sempre pelo facebook, sempre tirando dúvidas e passando dicas, comentei que um médico que respeito muito, disse que pela experiência dele, o primeiro bebê vem com 40 semanas e 4 dias. Falei isso pra ela, e ela disse: “Então se prepara, nasce domingo.”
No sábado a noite ela me ligou e avisou que as contrações haviam começado, e que o tampão tinha saído.
Durante toda a madrugada já em trabalho de parto ela continuou me mandando mensagens, e eu passava dicas e recomendações. Afinal, ela não precisa de mim desde o início do trabalho de parto, só precisa se sentir segura e saber como se ajudar.

Estava acompanhada do marido Tulio, que fez massagem e a confortou. As 7 da manhã acordo com um sonho que tive, Júlia nascia de cócoras, em casa. Imediatamente mandei uma mensagem para a Luana perguntando como ela estava, e contei do sonho. Por volta das 10 da manhã ela disse que precisava de mim, e eu comecei a me arrumar e fui. Devo ter chego por volta de 11:30, ela estava tranquila, com contrações de 5 em 5 minutos, no chuveiro. Ela saiu, já estava lá a um bom tempo, e disse que ia deitar. Tulio aproveitou para descansar um pouco, e a nossa amiga em comum foi junto, ficou na sala fazendo companhia a ele.

No quarto estávamos em total silêncio, ela estava totalmente nua, á vontade, o quarto escuro e aquecido pelo sol, mas estava muito agradável. Ela gemia, ensaiava uns gritos, e perguntava:” – Posso gritar?” Eu dizia que ela podia tudo, estava em seu lar.
Massagem, e quando ela precisava eu falava palavras de incentivo. Ficamos assim, as duas no quarto, ela levantou e foi para bola, a dor não deixava muito  tempo deitada. Depois sentiu que havia ficado mais forte, e desconfortável, recomendei o chuveiro e ela foi.
Recomendei que o Tulio colocasse as malas da maternidade no carro, Jéssica desceu e foi ajudá-lo, era bom deixar tudo pronto, pois o parto era planejado para acontecer no HU – Hospital Universitário- UFSC.

Comecei a ouvir um som característico de mulher parindo… ela gemia de maneira forte,  gritava e vocalizava, porque sentia necessidade de colocar aquela energia pra fora… comecei a achar que outra coisa além da energia estava saindo…
Me agachei e fiquei observando como ela se comportava nas contrações, por instinto ela ficou de quatro, e depois de cócoras e eu percebi que seu períneo estava modificando. Peguei o espelho que sempre carrego na mala de doula, e coloquei embaixo dela… pensei ser o topo da cabeça do bebê, mas a água me confundia.

Pedi então que ela saísse do banho, para que eu pudesse ter certeza. No quarto, ela agachou se segurando na cama e coloquei o espelho, agora eu tive certeza, era mesmo a Julia coroando.
Abri a porta e falei:” – Tulio, se prepare, não vai dar tempo de ir a lugar nenhum. Julia vai nascer em casa.”
Ele ficou pálido, acho que esqueceu de respirar por alguns minutos, mas veio rapidamente para o quarto.
Chamei a Jéssica, e disse:” – Pega a câmera!!!”

Fomos os quatro para o quarto, e a Luana estava extremamente calma e tranquila, não estava preocupada, estava feliz, Julia estava chegando.
Ela disse: “- Cris, não quero o parto deitada. Perguntei como ela queria, e ela disse que queria de cócoras.
Peguei uma cadeira para que o Tulio sentasse, e ela acocorou na frente dele, a toalha que ela usou para se enxugar ao sair do banho, dobrei e coloquei embaixo dela. Outra toalha seca ficou em cima da cama.

Coloquei luvas que sempre carrego para emergências ( como os bebês que já quiseram nascer no carro), e logo veio a contração, ela por instinto gritava, gritava e Julia começou a vir, junto dela veio líquido amniótico, a bolsa rompia e na mesma contração ela veio inteira.
Segurei ela e falei:” – Olha quem nasceu, olha quem nasceu….”
Coloquei ela no colo da Luana, que falava emocionada: “Minha filha, minha filha, meu amor…”
Tulio começou a chorar assim que viu ela, e acho que ele ainda não acreditava no que havia acontecido.
Julia nascia em casa, em um parto não planejado, mas de maneira tranquila, respeitosa e muito muito bonita.

Nascia cercada de amigos, pessoas que a Luana conhecia e confiava. Jéssica que filmava chorava muito também, e disse que a experiência de ver o um nascimento tão mágico, a transformou em outra pessoa. Luana sentou na toalha, e Tulio saiu da cadeira para sentar junto delas, e ali os três ficaram. Julia chorava para tranquilizá-los, era cabeludinha e tinha um lindo tom de pele cor de rosa.
O cordão pulsava a 140 por minuto, o que me fazia ter a certeza de que ela estava bem. Depois de um tempo ela parou de chorar e apenas observava os pais, chupava as mãos, e Luana colocou ela para mamar.

Enquanto eu e Jéssica apenas observávamos aquela linda cena, e a família que se formava, eles trocavam frases que nos emocionaram.
Luana – ” Eu nem acredito que eu consegui..” e o Tulio-  ” Conseguiu meu amor,conseguiu, eu falei que você era forte!”
Perguntei se ela queria deitar na cama, ela concordou, Tulio ajudou a apoiar Julia sem tirá-la do colo da mãe, e elas deitaram.
20 minutos depois do nascimento de Julia, a placenta saiu, e foi colocada em uma sacola, ainda conectada a Julia.
Ela ficou ali agarradinha na mamãe, cheirando e sugando o seio, enquanto Tulio ligava para a família para dar a notícia.

Como o parto não foi planejado para ser em casa, era necessário que ela fosse examinada, então ela comeu um lanche, e foi tomar banho. Enquanto isso fui arrumar Julia, o líquido aminiótico era tão claro e limpo, que praticamente a lavou, só restava um pouco de vérnix, que nem me incomodei de tirar pois faz bem para a pele do bebê. Coloquei uma fralda, e a vesti. Cobri com uma manta, o cordão estava ainda conectado, lembrei do curso com a parteira Naoli Vinaver, e  de como é bom deixar o bebê conectado a placenta, era quase um parto de lótus.
Luana saiu do banho, nem parecia que havia parido, Jéssica ( que acabara de se tornar madrinha) ficou encarregada de levar Julia, e Tulio ajudava Luana a descer com cuidado, afinal são lances e lances de escada.

A viagem até a maternidade foi tranquila, Julia dormia. Quando chegamos tinha muita gente esperando, familiares e curiosos que queriam ver o bebê que havia nascido em casa… que coisa incomum, de outro mundo…
Insistiram que ela fosse de cadeira de rodas, apesar de ter descido lances de escada sem qualquer dificuldade, e mal deixaram que ela arrumasse as pernas, saíram correndo para dentro da maternidade.
Tulio ficou para trás, não pode acompanhar a esposa. Ficamos todos na recepção. Depois de muito tempo deixaram que ele entrasse, para surpresa da equipe, ambas estavam bem e saudáveis, Luana teve uma laceração superficial e tomou alguns pontos. Luana ouviu comentários irônicos sobre o parto acidental em casa, sobre doulas, sobre índias etc. É triste como os profissionais podem ser tão ignorantes.
Por rotina elas tiveram de ficar internadas por dois dias, e então foram para casa. Julia, segundo Luana, é muito calma e só dorme.

Quero agradecer a Jéssica por ter colocado a Luana e o Tulio na minha vida, agradecer a Luana por ter me convidado para acompanhar a gestação e trabalho de parto, e ainda pela  honra de acompanhar um nascimento tão lindo e especial.
Parabéns, vocês são um casal maravilhoso e a Julia é linda.
Desejo muita saúda para ela e muita felicidade e luz para vocês!

Cris Melo
Téc Enfermagem, Mãe,
Doula e parteira por acaso. 

Atenção: Doulas não são habilitadas para atenderem sozinhas partos domiciliares ou hospitalares, apenas em casos inesperados.
Esse parto não foi planejado para ser em casa, porém o parto domiciliar com profissionais qualificados ( médicos, enfermeiras obstetras, parteiras e obstetrizes)
 é seguro segundo as evidências científicas. Se você deseja um parto em casa, procure um desses profissionais.

*Parto de lótus: É quando a placenta continua conectada ao bebê por dias após o parto, sem qualquer clampeamento ou corte do cordão umbilical. A separação entre o bebê e a placenta acontece naturalmente entre 4 e 10 dias.

” Precisamos reaprender o que é um parto livre das perturbações causadas pelos fatores culturais. Precisamos de um ponto de referência do qual não deveríamos nos afastar muito. O Parto de Lótus é esta referência.”

(Michel Odent)

 


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