Não lembro exatamente quando, mas lembro de certo ensaio fotográfico de um parto natural na água que vi no blog de uma fotógrafa. Achei maravilhoso. Desde esse dia comecei a pesquisar muito sobre parto natural e acabei encontrando o blog da Cris. Comecei a ler os relatos dos partos e fiquei fascinada com as histórias de cada um.

Sempre quis ser mãe. Chegou um momento que eu estava preparada, mas eu e o Ca ainda queríamos ajeitar algumas coisas e concretizar outras, então adiamos por algum tempo. Acontece que sempre vai ter alguma coisa faltando antes da decisão de ter filhos, mas quando chegasse a hora já estava decidido que quando eu engravidasse faríamos todo o pré-natal com um GO a favor (de verdade) do parto normal e teríamos o acompanhamento de uma Doula, a Cris!

No começo de 2016 decidimos que aquele ano começaríamos a tentar, sem pressa. Em 2015 já havia feito minha primeira consulta com o Dr. Fernando Pupin e retornei no ano seguinte para fazer os exames e verificar se estava tudo bem comigo. Estava. Como havia tomado pílula durante dez anos, imaginamos que demoraria um certo tempo até conseguir, afinal o corpo precisa se readaptar sem todo aquele hormônio. Senti bastante quando deixei de tomar o anti. No primeiro mês tive enjoo, tontura e uma crise de enxaqueca que durou quase uma semana. Eis que no terceiro mês comecei a sentir algumas cólicas, mas nada de menstruação…estranhei, mas achei que devia ser meu ciclo se organizando depois de tanto tempo recebendo uma “ajudinha” da pílula.

Eu já havia feito alguns testes de gravidez de farmácia, na maior parte das vezes sabendo que não estava grávida (isso vicia) e pensei que dessa vez não poderia ser diferente. Mas foi. Era um sábado a tarde e eu estava deitada no sofá reclamando das cóilcas quando comentei com o Ca que iria fazer mais um teste, porque já estava com essas dores há uns quatro dias e a menstruação ainda não tinha vindo. Fomos caminhando até a farmácia do bairro bem tranquilos, porque no fundo nós dois sabíamos que de novo eu faria o teste e não daria nada de diferente. Falei que ia esperar até o dia seguinte e fazer com a primeira urina da manhã, que dessa forma o resultado seria mais garantido, mas não aguentei. Fiz o teste e quando o segundo risquinho apareceu fiquei super nervosa. O risco estava fraco, mas estava lá! Nunca fantasiei em dar essa notícia pro Ca de uma maneira fofa e diferente, até porque estávamos fazendo todas as etapas juntos e quando tivemos a confirmação foi estranho e engraçado. Nenhum dos dois acreditava! Foi bem mais rápido do que podíamos imaginar. Decidimos sair pra comemorar e nessa mesma noite compramos os primeiros presentes pro bebê: livros.

No começo da gestação tive um sangramento estranho. Apesar do médico dizer que pode acontecer, que o tipo de sangramento não era preocupante eu fiquei aflita e abalada por uns dias e só me recuperei quando o sangramento parou de vez. A gente mentaliza que vai ser o que tem que ser e procura confiar no nosso corpo, mas a realidade é que nessa hora queremos uma garantia de que tudo vai ficar bem e nem sempre temos.

Passado esse susto foi tudo tranquilo. Tive náuseas só no começo, um pouco de perda de apetite e muita vontade de comer laranja e abacaxi! Continuei fazendo exercícios, trabalhando…rotina normal. Era assim que eu imaginava que seria até o fim.  A data prevista para o parto era 15 de março, lógico que raramente seria nessa data, poderia ser entre duas semanas antes ou depois. Decidi que iria trabalhar até o ultimo dia e não me afastar antes, porque não queria ficar em casa ansiosa esperando o bebê chegar.

Obviamente as coisas nem sempre são como esperadas. No dia 7 de fevereiro, fui trabalhar normalmente, voltei pra casa e depois fui pro Pilates. Em casa eu e o Ca jantamos e depois, durante o banho, notei que um líquido não parava de sair. Como era pouca quantidade pensei que era corrimento ou até xixi. Saí do banho, fui até a cozinha e vi que continuou pingando. Imaginei talvez que minha bexiga não estivesse conseguindo conter o xixi, mas achava engraçado que vontade de ir ao banheiro eu não tinha. Mesmo assim fui ao banheiro e de novo, eu me limpava e pingava mais ou pouquinho. Resolvi deitar e esperar o Ca sair do banho. Assim que deitei, percebi que havia manchado bastante o lençol. Tirei foto e mandei pra Cris perguntando o que poderia ser aquilo.

Eram 11 horas da noite. Como ela não visualizou, mandei a mensagem pro Dr Fernando e achei sinceramente que ele iria dizer algo do tipo “isso é tal coisa, normal no final da gestação”, mas ele pediu para eu ir pro Ilha avaliar, que ele estava lá atendendo um parto (a Cris estava junto por isso não viu minha mensagem) e que avisaria a médica do plantão que eu estava indo. Gelei. Quando o Ca saiu do banho ele olhou pra minha cara (eu devia estar mais pálida do que já sou) e perguntou o que estava acontecendo, e eu contei. Depois disso, tudo foi bem rápido e confuso. Lembro de ter colocado um vestido e pego uma toalha pra poder sentar no carro sem molhar tudo, porque a essa altura o líquido estava mesmo escorrendo pelas minhas pernas. O Ca se trocou em segundos, quando vi já estávamos a caminho da maternidade. O trajeto foi curto e silencioso, de vez em quando o Ca perguntava se eu estava bem… dizia que tudo ia dar certo. Eu estava calma, nem lembro o que se passava pela minha cabeça. Quando chegamos na maternidade, desci do carro e aí sim senti muuuuito líquido descer, cheguei a tirar meu chinelo pra não escorregar. Quando cheguei na recepção a moça pediu pra eu entrar e eu fiz uma cara tipo “moça vou sujar tudo”. Ela perguntou se era bolsa rota e respondi que achava que sim. Pediu pra aguardar que a médica logo faria a avaliação.

Quem nos atendeu foi a Dra Flávia, muito querida e atenciosa. Confirmou que minha bolsa havia rompido e que estava com 3cm de dilatação. Falou também que eu iria internar. Assustei! Estava com recém completas 35 semanas. Ainda faltava organizar muitas coisas que tínhamos programado pros próximos dias, como passar as roupinhas do neném e arrumar a mala da maternidade. Naquele dia mesmo eu havia falado com minha mãe e estava feliz porque ela havia encontrado pijamas com abertura frontal pra eu levar pra maternidade e poder amamentar. Eu ainda estava calma, o Ca do meu lado, quando chegou o Dr Fernando após ter finalizado o parto em que estava. Me tranquilizou e disse que tudo ia dar certo, que provavelmente o bebê não precisaria ir pra UTI neo… opa, isso era uma coisa que ainda não havia me ocorrido.

Sabia que seria um bebê prematuro, mas não tinha cogitado UTI… comecei a chorar! Ele perguntou se queríamos que ele ficasse, mas por questões financeiras optamos em fazer o parto com o médico plantonista. A reputação dos médicos do Ilha é muito boa, sei só de alguns que não são muito adeptos ao parto natural, mas estávamos tranquilos porque a Cris estaria conosco para auxiliar e orientar. Penso que os médicos devem gostar, ou se não gostam deveriam, do acompanhamento da doula com as gestantes em trabalho de parto. A parte psicológica nessa hora é a mais difícil de controlar.

Depois do Ca preencher a papelada fomos pro quarto. Tomei banho e logo chegou a Cris depois de ter atendido a outra gestante que havia parido (se não me engano naqueles dois dias ela atendeu três ou quatro gestantes uma atrás da outra!). Ela ficou comigo enquanto o Ca voltava pra casa pra arrumar a mala do bebê, pegar algumas roupas pra mim …correria, mas ela estando comigo fiquei tranquila.

Conversamos, tirei uma soneca até que comecei a sentir as contrações e pensei: tá tudo tranquilo, tá suportável. Quando o Ca voltou a Cris foi pra casa descansar e pediu que avisássemos quando as contrações estivessem regulares, com intervalos curtos e durando um determinado tempo. Tentei descansar mais um pouco e acho que consegui. As contrações começaram a ficar mais fortes, tomei mais um banho, fui no banheiro umas cinco vezes eu acho (natureza perfeita), tomei banho de novo, fiquei na bola, fui pra cama, voltei pra bola…o Ca o tempo inteiro me ajudando, apoiando, fazendo massagem nas minhas costas e dizendo que eu ia conseguir. Dra Flavia voltou para fazer avaliação umas 3 horas da madrugada… estava com 6cm! Ótimo! Dali pra frente não sei exatamente a que horas, mas começou a ficar muito difícil! O Ca havia pedido pra avisar quando viessem as contrações pra ele poder contar no aplicativo, mas nem precisei, ele via minha angústia.

Não encontrava mais nenhuma posição confortável, quando a contração vinha eu tinha vontade de sair correndo, fugir da dor, sei lá. A impressão que eu tinha era que meu corpo estava se abrindo ao meio (na verdade estava abrindo mesmo). O Ca chamou a Cris pelo whats, disse que eu não estava mais aguentando. Não lembro de ter visto ela chegar, porque depois de cada contração eu praticamente desmaiava de dor, devo ter dormido. É importante dizer que a dor é diferente pra cada pessoa e cada um recebe e lida da sua forma. Até então achei que estava suportando bem, porque foi a pior dor que senti na minha vida. Difícil explicar!

A Cris assumiu o posto do Ca, massageando as minhas costas e juntos os dois me incentivavam, pediam pra eu não desistir e diziam que logo ia passar, que a dor era sinal que o bebê estava mais perto de chegar. Cheguei a um ponto que realmente não aguentava mais, tinha vontade de vomitar de tanta dor e implorei por analgesia. O Ca me lembrou que eu já tinha pedido analgesia bem antes e que fui em frente por mais um bom tempo, mas naquele momento eu estava beirando a loucura! Lembro de dizer que eles não estavam acreditando na minha dor! Quando decidi que realmente ia tomar a analgesia, estavam trocando o plantão, e demorou uma meia hora (a meia hora mais longa da história) para o próximo médico vir avaliar. O Dr Roger entrou no quarto umas 7:30 da manhã, muito querido e bem tranquilo, fiquei segura. Com a avaliação dele vimos que eu estava já com 9cm, quase lá!

Ele perguntou se eu realmente queria a anestesia, porque já poderíamos ir direto pra sala de parto. Hoje, quando revivo esse momento, eu penso que eu deveria ter tentado suportar mais um pouco a dor, mas como disse a Cris: falar isso AGORA é fácil. E realmente, na hora foi o que eu achei que seria melhor, não pesei todos os contras e nem me lembrei de tudo que uma anestesia poderia acarretar. Acho até que nem sabia. Eu estava tão fraca que só queria um tempinho sem aquela dor insuportável.

Era quase 8 da manhã quando fui pra sala tomar a injeção. Toda a equipe foi muito atenciosa e preocupada. Quando senti o efeito da analgesia, nossa. Pensei que essa era a melhor coisa que já havia sido inventada. Fiquei um tempo em observação, que pra mim foi super rápido, mas o Ca disse que levou quase uma hora, e depois fomos para a sala de parto. Em função da anestesia eu não pude ir pra banheira, pois minhas pernas estavam amortecidas, coisa que eu não sabia. Quando o efeito da anestesia passou (na minha cabeça achei que ia ficar sem dor até o bebê nascer), a dor voltou com tudo (voltou primeiro no lado direito, o esquerdo ainda estava anestesiado) e nessa hora comecei a fazer força. Fiquei um tempão no banquinho, mas não estava conseguindo acertar a força que precisava fazer.

O bebê descia e depois subia de novo. Tentei ficar de quatro em cima da cama, mas piorou. O Dr Roger sugeriu que eu ficasse deitada com as pernas elevadas e, apesar de saber que essa não é a melhor posição e que a gravidade também não ajuda, foi assim que senti menos pressão e consegui descansar entre uma contração e outra e aos poucos acertando a força pro bebê descer. Apesar de estar com dilatação total, as contrações, provavelmente em função da analgesia, já não estavam tão frequentes e não duravam o tanto que deveriam durar. Vinham com intervalos longos e duravam quase nada então o Dr. Roger achou melhor colocar ocitocina. Nessa hora eu fiquei muda e sinceramente hoje me pergunto porque não neguei esse procedimento, porque eu definitivamente não queria ocitocina. Queria que as contrações viessem sozinhas.

Acontece que na hora, além de exausta, fiquei preocupada com o bebê, não sabia mais quanto tempo aguentaria fazendo força e não queria que terminasse em cesárea. Já estava há uma hora e meia assim. Dessa forma, fui pra ocitocina e a partir daí o bicho pegou. Não lembro por quanto tempo fiz força. Fiquei mais motivada quando o Dr Roger disse que a cabeça já não voltava mais quando eu parava de fazer força e que logo ele nasceria. Depois da aplicação da ocitocina, o Murilo levou meia hora pra nascer. Foi uma contração atrás do outra e mal dando tempo pra respirar. Não senti a dor do famoso “círculo de fogo” quando ele coroou, provavelmente por ser um bebê pequeno e depois que saiu a cabeça fiz mais uma forcinha e ele nasceu, as 11:05 da manhã!

Meu bebê Murilo lindo! Recebi ele nos meus braços e escutei o Ca chorar de emoção do meu lado. Um bebê pequeninho e quentinho… estava meio engasgado, olhei pro médico perguntando se ele estava bem. “É normal, ele logo vai soltar o líquido que tá preso”… e soltou mesmo. Que bebê forte! Ele ficou um tempo conosco e depois o pediatra fez a avaliação. Apesar de nascer com 35 semanas ele nasceu com 2.840kg e 47cm. Graças a Deus teve uma boa avaliação e não precisou de UTI. Notícia que acalmou nossos corações! Depois de enroladinho, ele veio pro meu peito. Com a ajuda da Cris, esse bebê faminto acertou a pega e lá ficou, mamando e me olhando! Mesmo eu estando bem atordoada lembro bem desse momento e da sensação incrível que foi ter ele no meu colinho mamando pela primeira vez!

Eu nunca idealizei um parto perfeito, e isso é importante pra não haver frustração. Apesar das intervenções, me senti vitoriosa por ter conseguido trazer meu filho pro mundo dessa maneira tão linda. Pra mim foi realizador. Falar de parto é muito delicado, porque muita gente se sente atacada, reprimida, julgada, mas pra mim, falar do MEU parto e de como me senti é poder falar de como testei meus limites e consegui suportar mais do que imaginei. A dor não me fez mais mulher, nem mais mãe, me fez um pouquinho mais humana e possibilitou um conhecimento maior do meu corpo e da minha força. A dor serve como teste e pra mostrar que tudo a partir dali vai ser diferente e teremos que ser fortes, de uma maneira ou outra. E é importante pra mim dizer que, dentro das minhas possibilidades, consegui parir meu filho naturalmente.

Agradeço a meu marido abençoado que sempre está do meu lado, foi aberto a escutar e entender esse mundo do parto natural. Eu só sabia falar nisso e ele nunca pediu pra eu virar o disco, muito pelo contrário, aceitou e estudou comigo todos os benefícios. Quando falei da Cris ele também apoiou, pois queria que eu me sentisse o mais segura e acolhida possível nesse momento, pois tinha a consciência que eu estava carregando e trazendo nosso filho.

Agradeço ao meu médico Dr Fernando Pupin que nos acompanhou durante a gestação sempre com muita tranquilidade e nos dizendo pra encarar o parto da forma que realmente era: a mulher como protagonista desse momento e um médico estando lá para o auxílio, e não o contrário.

Aos médicos que estavam de plantão no dia, Dra Flavia e Dr Roger, agradeço pelo atendimento humano, como todos deveriam ser. Olhar para uma mulher parindo e realmente ver isso. Não achar que a dor é besteira, que é exagero, que poderia fazer mais do que já está fazendo. A empatia nos dá força e segurança nesse momento.

A equipe da Maternidade também foi excelente. Tivemos a sorte de pegar bons profissionais, muito preocupados e queridos. Lembrando que se trata de um hospital com muito procedimento padrão. Ainda tem que melhorar e muito.

À minha doula querida, Cris, que só me trouxe coisas boas, foi hiper atenciosa comigo e com meu marido também, evitando deixar ele aflito com minha dor. Deixando o ambiente mais descontraído e menos hospitalar possível. Cris, você é um investimento que vale cada centavo. Sua companhia foi fundamental! De quebra me proporcionou conhecer outras gestantes e mamães e dividir com elas as maravilhas e angústias do dia a dia da maternidade.

Essa experiência toda foi transformadora nas nossas vidas, já nem lembro mais como era minha vida sem o Murilo, parece que depois que ele nasceu tudo fez mais sentido. Antes de engravidar a gente pensa basicamente no material, estrutura, ter tudo montadinho e pronto para receber o bebê e mal sabemos que a maior preparação é a psicológica, e que essa sim deveria ser possível comprar! Carinho, atenção e muita paciência é o que um bebê vai exigir, e o quanto, só vivenciando pra saber.