1. Não existe bebê ficar mal porque “bebeu água do parto” ou porque “engoliu mecônio”. Bebês bebem água do parto durante metade da gestação, o tempo todo. E o mecônio é uma substância estéril e sem risco para o tubo digestivo. O perigo real é a aspiração profunda de mecônio, porque obstrui os alvéolos e frequentemente está associado a um evento de anóxia perinatal. Na verdade os novos protocolos de reanimação neonatal dizem para não perder tempo aspirando um bebê com mecônio. Se não estiver bem, entuba e leva pra UTI. Ou seja, se for líquido, não aspire, se estiver bem, não aspire, se tiver mecônio e estiver bem, não aspire. Se tiver mecônio e estiver com problemas, leve pra UTI, não perca tempo aspirando.

2. Na maioria das situações normais, o fator determinante para o início do trabalho de parto é o bebê. Quando seu pulmão (último órgão a amadurecer) fica pronto, começa a produzir surfactante, que cai no líquido amniótico e provoca uma reação em cadeia que faz a mulher entrar em trabalho de parto. Portanto quando a mulher não está em trabalho de parto significa, em geral, que o bebê não está maduro. Para entrar em trabalho de parto, não adianta escalda pé, acupuntura, comida apimentada e escrever cartas. O que adianta é pedir pro bebê produzir logo um pouco de surfactante!

3. Não existe dilatação de “5 dedos”. A dilatação se mede com 1 dedo, 2 dedos e a partir disso são centímetros, pois não dá para colocar 3 dedos, 4 dedos.. até dá, mas não é bonito. Então a dilatação vai em 1 dedo, 2 dedos, 3 cm, 4 cm… até 10 cm.

4. Todos os bebês nascem roxos, porque dentro do útero eles vivem o tempo todo com essa cor, sendo o útero um ambiente de baixa oxigenação. Só quando nasce e respira é que ele vai começar a ficar cor de rosa aos poucos. Portanto, quando disserem “você passou da hora, tanto que nasceu roxo na cesárea”, desconfie. Bebês nascem roxos, todos! Inclusive hoje, nos novos protocolos de reanimação, já não se considera a cor rosa como item essencial para um bebê que acaba de nascer.

5. A gravidez humana dura EM MÉDIA 38 semanas a partir da concepção ou 40 semanas a partir da última menstruação. Quando falamos que a gestante está de 28 semanas, já estamos contando da menstruação. Se fôssemos falar a partir da concepção, diríamos que ela está de 26 semanas. A contagem em mês é artificial e aleatória. Com 28 semanas tem gente que chama de 7 meses, tem gente que chama de 6 meses, tem gente que chama de 6,5 meses. Contagem em meses tem apenas fins recreativos.

6. A medida do comprimento do recém nascido também tem fins apenas recreativos. Como o bebê sempre está encolhido, então não dá para medir com exatidão. Essa medida só serve para a diversão da galera, e não entra em nenhum levantamento de saúde. Nem entra na DNV, declaração de nascido vivo. É que nem medir o bíceps de um menino de 8 anos para saber se ele é forte. Se três pessoas diferentes medirem o mesmo recém nascido, teremos três medidas diferentes. A única medida que tem importância num recém nascido é o peso.

7. Todos os bebês têm algum nível de icterícia fisiológica, aquele amarelo na pele e olhos nos dias seguintes ao nascimento. Eles nascem com excesso de hemáceas, que ao serem degradadas produzem a bilirrubina, substância amarela. Aos poucos o fígado metaboliza a substância e a cor da pele vai voltando ao normal. São raríssimos os casos de icterícia patológica que requerem banho de luz. A imensa maioria dos bebês internados nas UTIs neonatais privadas estão lá ajudando a pagar o equipamento, só isso.

8. Quando a bolsa se rompe, o bebê continua produzindo líquido amniótico através da urina, e sua cabecinha faz uma “rolha” que veda o colo do útero provisoriamente. Assim, ele sempre terá líquido amniótico ao seu redor! Não à toa que um bebê que nasce com bolsa rompida há muito tempo, frequentemente ainda vem numa torrente de água! É bom lembrar que a principal função do líquido é a proteção contra choque. Bolsa rompida não faz o bebê nascer seco.9. O cordão umbilical é preenchido de uma geléia elástica que faz com que ele seja praticamente “incomprimível”, mantendo assim os vasos sanguíneos bem protegidos. Por isso que em situações normais, circulares de cordão (seja quantas forem), não tem significado!

10. Tecnicamente o cordão umbilical não precisa ser cortado em nenhum momento específico após o parto. Se a família quiser, pode esperar a hora do banho da mãe, ou da pesagem do bebê. Se o bebê nasce na rua ou em casa, é para deixar o cordão ligado. O cordão não faz mal ao bebê! Ele faz parte de um sistema fechado bebê-cordão-placenta, por onde não tem como os germes entrarem. Na dúvida, não corte o cordão.

11. Durante o parto, o que dilata é o colo do útero, aquela estrutura lá no fundo do canal vaginal, que fecha o útero e mantém o bebê lá dentro por 9 meses. É lá que a gente mede a dilatação. Depois disso, no canal do parto, vem só tecido elástico, que não precisa dilatar para o nascimento, mas sim “esticar” conforme a cabecinha do bebê vai descendo para nascer.12. Apgar é uma nota que se dá ao bebê quando ele nasce. Não precisa fazer nada, só observar o bebê. A primeira nota se dá com 1 minuto de vida e não tem maior importância. Já a segunda nota se dá com 5 minutos de vida e diz mais ou menos as condições do recém nascido naquele momento. Qualquer nota acima de 7 no quinto minuto já é uma boa nota. A nota do primeiro minuto não é levada em consideração em nenhum tipo de levantamento. Portanto é perferível um bebê que nasce com notas 2 e 8, do que um que nasce com nota 5 e 6.

Ana Cristina Duarte
Obstetriz
São Paulo, SP