5 - gravida

Eu nasci de cesárea, minha mãe nasceu de cesárea, então era óbvio que a minha filha também ia nascer de cesárea. Ainda mais que a gente passa a vida inteira ouvindo que a dor do parto é a pior dor do mundo, que ninguém agüenta, só as malucas tem parto normal, as índias, as que não tem condições de pagar e comigo não ia ser diferente. E com 1,58m, meu marido com 1,88m, os dois cabeçudos, jura que eu ia conseguir ter parto normal.

Mas daí eu engravidei, e junto com a gravidez veio um negócio, um instinto, de que tudo tava errado. Então eu fui atrás de informação. Primeiro eu decidi: vou fazer cesárea, mas pelo menos vou esperar entrar em trabalho de parto, não vou marcar a data. Isso foi o começo de uma mudança que já não tinha mais volta.

Ainda bem que quando a gente engravida quer andar junto das amigas grávidas, das que tiveram filho, pra absorver a maior quantidade de experiência possível. Nesse ponto eu tirei a sorte grande! Graças a duas grandes mulheres (Laís e Elisa) eu tive a oportunidade de ouvir sobre o parto natural (uma delas tinha parido em casa – oi?? – coisa de gente maluca, eu pensava) e elas foram plantando uma sementinha dentro de mim, que crescia todo dia. Cada dia uma vontade nova me aparecia: quem sabe eu “tento” um parto normal, quem sabe eu nem tome anestesia, quem sabe a gente deixa o cordão pulsar até o final, quem sabe a gente contrata uma doula – oi?? – coisa de hippie, eu pensava. E aos pouquinhos fui mudando a minha cabeça cesarista e a cabeça do marido cesarista (que no final virou tão ativista quanto eu).

Daí veio o primeiro passo: contratamos a Cris. Foi o divisor de águas na minha vida e junto veio o segundo passo: trocamos de obstetra pra nossa querida Juliany Silva (isso com 32 semanas) e assim foi tomada a decisão final: eu ia ter um parto natural, sem intervenções, no dia e hora que a minha filha quisesse nascer.

Dia 18/10/13, 3:30h da manhã: depois de várias tentativas de dormir, muito mal estar e dor de barriga, começamos a marcar as contrações. Só que elas não vieram espaçadas como era esperado, vieram feito um furacão a cada 2 minutos.

1 - parto 009

Como eu tinha strepto positivo, fomos pra maternidade lá pelas 4h da manhã. Fizemos toque e eu estava com 4cm. Nessa hora o que aconteceu na minha cabeça de engenheira: cheguei aqui às 4h, às 6h já to com 4cm, 9h da manhã eu to parindo! Então fiquei na banheira relaxando e as contrações bem fortes, mas ainda sim eu dormia entre elas.

2 - parto 013

Só que lá pelas tantas, no meio da manhã fizemos o toque de novo e adivinha? 6cm! Nessa hora eu fiquei louca, minha cabeça racional não entendeu porque o corpo não a acompanhou. Isso é uma coisa complicada em um trabalho de parto, onde a gente tem que se entregar e confiar no próprio corpo. Então eu deitei na maca chorando e pedindo anestesia achando que eu não daria mais conta.

Eu já estava sem dormir, sem comer (comi só sorvete durante o trabalho de parto – toda hora tinha vontade de vomitar), exausta! Mas graças a um marido que sabia o que era melhor pra mim e pra Alice eu não tomei. Nós sabíamos dos riscos de qualquer intervenção, que a anestesia poderia levar a uma desaceleração dos batimentos e consequentemente a uma cesárea, e se tinha uma coisa que não se passava pela minha cabeça nesse dia era a cesárea. Em NENHUM momento me passou pela cabeça ter que ir pra cirurgia. Fora que pra tomar a anestesia eu ia ter que fazer outro exame de toque e eu não queria mais fazer nenhum! Então eu levantei da maca e sentei no bendito banquinho de cócoras.

Que banquinho salvador! Cada mulher tem instintivamente vontade de parir em uma posição e a minha já estava decidida, seria de cócoras. Depois desse “momento de covardia” (que a maioria das mulheres passa no trabalho de parto) eu agüentei mais umas 8h sem anestesia.

6 - parto 001

 

3 - parto 023

No finalzinho do expulsivo, acabei indo pra dentro da banheira de novo. Como eu não achava posição, colocaram o meu querido banquinho dentro dela e assim a Alice nasceu, aparada pelo pai (que já estava com as mãos preparadas pra pega-la pelo menos umas duas horas antes!). Mas infelizmente ela veio apagadinha e todos os meus planos em relação ao tratamento que ela deveria receber na hora do nascimento foram por água abaixo. O cordão precisou ser cortado imediatamente, ela foi aspirada (estava limpa) e tentaram entubá-la (ela rejeitou o tubo e respirou sozinha). Nessa hora eu não estava entendendo o que estava acontecendo, depois de cerca de 16h em trabalho de parto eu tava ali, dentro da banheira, atordoada. Fui levada pra maca pra poder tirar a placenta. A Ju costurou minha laceração que foi bem grandinha (falei que éramos cabeçudos) e depois a Alice veio pros meus braços. Infelizmente ela não mamou, ficou ali dormindo. Ela era linda, perfeita e naquele momento parecia que tudo estava bem. A experiência do parto foi realmente transformadora. Eu me sentia a mulher mais incrível do mundo naquela hora! É maravilhoso saber o quão forte a gente é.

4 - parto 053

No fim da noite, já no quarto, a respiração da Alice ficou um pouco estranha. Ela foi levada pra UTI pra observar e não voltou. No dia seguinte nos falaram que ela tinha convulsionado. Diagnosticaram uma

lesão no cérebro por possível hipóxia na gravidez. Pros desavisados e mal informados, não, NÃO FOI DO PARTO. Não, ela não estaria bem se tivesse nascido de cesariana. Aliás, provavelmente ela não estaria viva se tivesse nascido de cesariana porque após a convulsão ela ficou 31 dias na UTI da maternidade e mais 17 dias no Hospital Infantil, tudo em decorrência de uma infecção hospitalar e todos os médicos foram categóricos em dizer que o que salvou a Alice foi ela mesma, a força que ela tem, os anticorpos que ela pegou de mim durante o parto (o que não aconteceria se ela tivesse nascido de cesárea), porque muita gente morre mesmo tomando os antibióticos que ela tomou, inclusive adultos.

Mas hoje estamos bem, faz um mês que ela tirou o gesso pelvipodálico (colocado após uma cirurgia pra consertar mais um estrago feito pela bactéria que ela pegou na UTI), é muito esperta e já está comendo comidinhas. Está atrasada, lógico, mas tem todo potencial do mundo pra ser o melhor que ela pode ser. Aliás, Alice, esse relato é pra ti, pra tu saberes quanto respeito eu tive por ti, pela tua hora, e quanto orgulho eu tenho de ter essa filha maravilhosa que tu és. Te amo muito, minha beibessaura!

E um conselho para as que pretendem parir: confiem em vocês. Se conseguirem (e quiserem) ter um parto mais ativo, caminhem, agachem, ou então relaxem na banheira, não tenham pressa. Pode ser que o parto seja rápido, mas é muito provável que não seja. E o principal: não criem expectativas demais. Pode ser que a banheira não esteja disponível, pode ser que precise de uma intervenção, pode ser que venha menina

ao invés de menino ou que venha a cara do pai (bem provável), e pode ser que venha um bebê especial. Não estamos preparadas pro “pior”, mas devemos ser conscientes que as coisas podem não ser do jeito que a gente idealiza.

Obrigada Cris e obrigada Ju. Eu sei que fui eu que fiz o parto, mas vocês foram fundamentais pra que ele fosse do jeito que eu queria. Obrigada pela paciência e por ficarem do meu lado durante tantas horas. Obrigada pelo apoio de vocês antes e depois e também com os cuidados com a Alice.

E por fim, obrigada Alves, meu marido, meu “doulo”. Aprendeu a lição direitinho e colocou em prática na hora que precisou. Te amo e te admiro muito!

Aline Almeida